Dharma

Estamos numa qualquer floresta verdejante onde a fauna impressiona pela sua variedade e beleza, e a calmia é devastadora, sendo apenas audível o canto celestial de algumas aves.

Aí, sob uma pequena cascata envolta por árvores de grande portento, e uma pouca vegetação rasteira, um homem de um moreno muito escuro, com as pernas cruzadas e as mãos sobre os joelhos era atingido pela vigorosa corrente de água cristalina.

Completamente desnudo, o seu corpo era bem torneado, próprio de alguém a que o exercício físico fosse mais que um simples passatempo. No centro da sua testa, uma minúscula marca vermelha sobressaía na sua cabeça, nua como o corpo.

De olhos fechados, imóvel, impávido e sereno, o homem aparentava estar nalgum transe, tal a calma por ele evidenciada. Calma que é quebrada instantaneamente por um súbito abrir de olhos, olhos castanhos muito vivos.

O indivíduo mirava agora o céu limpo, onde o sol brilhava intensamente.

Raj: Então o momento chegou, não é assim?

Como que aguardando por uma resposta, Salumane continuava a olhar para o infinito.

Raj: Muito bem…

De um modo vagaroso, Raj levanta-se, saindo debaixo da cascata, e caminhando alguns metros, num percurso que já conhecia. Por entre a imensa vegetação, dá de encontro com um homem em muito semelhante a ele, só mais velho teria no mínimo os seus sessenta anos.

Recostado sobre uma árvore com o tronco particularmente robusto, com uns minúsculos óculos circulares assentes na ponta do seu nariz aquilino, lia um livro de tamanho invulgar, que segurava numa só mão.

Frente ao velho umas pouquíssimas peças de roupa, e uma enorme mochila, claramente preenchida. Sem uma troca de olhares directas, Raj veste as calças laranjas de um tecido laranja num breve momento, apertando-as depois fortemente com um cinturão negro, enquanto que o outro se limitou a passar uma página do livro com o polegar.

Velho (fechando o pequeno livro e olhando nos olhos de Raj): Já te sentes pronto?

Raj (retorquindo de imediato): Sim, o tempo de prosseguir é agora.

O velho cerra o pequeno livro, e ergue-se com uma pujança anormal para alguém da sua idade, Raj agarra a mochila e coloca-as sobre as costas, vacilando por um breve instante.

Velho: É pesada, eu sei.

Salumane lança um sorriso miúdo, mas verdadeiro ao seu companheiro.

Salumane: Leve, para o peso que as minhas costas realmente transportam.

O velho sorri de volta e assente. Os dois iniciam assim o caminho de regresso, seja para onde for.